Publicada Segunda-feira, 12/11/2018

Guedes assumirá Trabalho e coloca em risco o fim dos direitos garantidos na CLT
A nova carteira, que agora começa a ser delineada, vai assegurar apenas direitos constitucionais, como férias remuneradas, 13º salário e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

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O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, deverá receber a superpoderosa Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, após o fim do Ministério do Trabalho, no governo Jair Bolsonaro (PSL).

Com as atribuições do órgão, Guedes terá sob sua responsabilidade a carteira de trabalho, quando poderá criar a carteira verde e amarela, promessa de campanha.

A nova carteira, que agora começa a ser delineada, vai assegurar apenas direitos constitucionais, como férias remuneradas, 13º salário e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

Além da carteira, atual secretaria concentra programas como seguro-desemprego e abono salarial, além do Codefat (conselho do Fundo de Amparo ao Trabalhador), o que amplia a força de Guedes. O FAT tem previsão orçamentária de R$ 76,8 bilhões.

O rearranjo ministerial com essa estrutura bilionária integra um conjunto de mudanças planejadas pelos assessores de Bolsonaro dentro de um projeto maior que prevê o aprofundamento da reforma trabalhista de Michel Temer.

As novas regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) completam neste domingo (11) um ano. O principal efeito da reforma se deu no volume de processos na Justiça do Trabalho (veja quadro).

Na esteira das ideias liberais de Guedes, a equipe do presidente eleito que trata do tema tem a meta de avançar na flexibilização dos contratos de trabalho, sob o argumento de que o fim do engessamento tende a ampliar empregos.

Críticos, porém, preveem um esvaziamento da CLT com a carteira verde e amarela.

A previsão é que o regime mais flexível, em que o trabalhador aceita menos direitos trabalhistas em troca de uma remuneração maior, seja registrado no novo documento.

Os demais direitos, bem como deveres, seriam fixados em negociação entre empregador e trabalhador, individualmente, ao exacerbar "o negociado sobre o legislado".

A livre escolha, em princípio, caberia apenas aos novos trabalhadores, aqueles que ainda não tiveram nenhum vínculo empregatício e estão chegando ao mercado.

A carteira verde e amarela também seria a porta de entrada para o regime de Previdência de capitalização (em que a aposentadoria é resultado do que o trabalhador foi capaz de poupar na vida).

Durante a campanha, Guedes disse à GloboNews que a carteira azul representaria o emprego tradicional. "Porta da esquerda: você tem sindicato, legislação trabalhista para te proteger, encargos."

A CLT valeria para os contratos da carteira azul, do "sistema antigo". A verde e amarela seria o "novo sistema".

"Se houver para os mais jovens uma mera opção, na carteira verde e amarela, as empresas vão aceitar quem tem a verde e amarela e, em 20 anos, não teremos trabalhadores da CLT", afirmou Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra (associação dos juízes trabalhistas) e professor da USP (Universidade de São Paulo).

"Ela torna obsoleta a CLT, torna letra morta a CLT. Preocupa sob vários aspectos."

O presidente eleito já sinalizou a intenção de fazer mudanças. "Aqui no Brasil tem direito para tudo, só não tem emprego", disse Bolsonaro na sexta-feira (9), em transmissão ao vivo em redes sociais.

"Já ouvi a esquerda falar 'ele quer acabar com direito trabalhista'. Então, antes que falem besteira esse pessoal da esquerda e alguns órgãos de imprensa, os direitos trabalhistas estão no artigo 7º da Constituição", afirmou.

"Está cheio de direito lá. Não tem como tirar, não vou dar murro em ponta de faca, é cláusula pétrea. É o país do direito. Você tem tanto direito e não tem emprego. O que queremos? Destravar a economia", afirmou Bolsonaro.

A adoção de contratos mais flexíveis de trabalho ajudou a gerar mais empregos em países como a Alemanha e a Espanha, segundo o economista Bruno Ottoni, do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia) e da consultoria IDados.

Os primeiros resultados apareceram em pelo menos cinco anos. No Brasil, neste primeiro ano de reforma trabalhista, o efeito foi fraco sobre a geração de postos de trabalho, na avaliação de Ottoni.

Segundo dados do Ministério do Trabalho, as novas modalidades de emprego (contratos intermitentes e parciais) geraram 55 mil postos de trabalho até setembro.

Já o trabalho informal (sem carteira) e por conta própria abrigaram mais 1,186 milhão de pessoas no ano encerrado em setembro, segundo o IBGE. Quase 12 milhões disseram que buscaram emprego e não conseguiram.

Para esse contingente, a carteira verde e amarela não teria utilidade, a menos que pudesse abarcar os trabalhadores que já estão na ativa. Essa, porém, não é a ideia inicial dos economistas de Bolsonaro.

O mais provável, segundo o desenho feito até agora, é que quem optar pela carteira verde e amarela siga com ela durante a carreira, até mesmo por não contribuir para o atual sistema de Previdência.

O chefe do MPT (Ministério Público do Trabalho), Ronaldo Fleury, criticou o argumento de que a flexibilização é capaz de gerar emprego.

"[Mais flexibilização] não vai aumentar a empregabilidade, não vai diminuir a informalidade. Só vai tirar direitos."

O professor de direito do trabalho da USP Flavio Roberto Batista minimizou a proposta da nova carteira.

"Não acho importante esse ponto, porque a proposta fala em escolher entre a carteira azul, com direitos, e uma verde e amarela, sem direitos. Isso viola a irrenunciabilidade de direitos", afirmou.

"A medida é completamente inconstitucional. Essa proposta é um devaneio."

Interlocutores de Bolsonaro, porém, falam em aperfeiçoar e melhorar a modernização da legislação trabalhista.

A atual reforma, assim, não necessitaria de ajustes, e suas alterações aprovadas no Congresso já foram superadas e não serão rediscutidas.

O superministério da Economia, com funções do Trabalho, Planejamento e Mdic (Indústria, Comércio Exterior e Serviços) possibilitará à equipe de Guedes capitanear as mudanças.

A maioria das demais atividades do Trabalho, como fiscalização, ficaria no Ministério da Justiça, de Sergio Moro.


Principais direitos trabalhistas constitucionais

- FGTS

- 13º salário

- Salário mínimo

- Férias remuneradas

- Aviso prévio

- Seguro-desemprego

- Repouso semanal

- Licença-maternidade

Principais direitos trabalhistas da CLT

- Carteira assinada:
a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) deve ser devolvida ao funcionário em até 48 horas do primeiro dia de trabalho, com dados do empregador, valor do salário definido na contratação, data de admissão e cargo ocupado (artigo 29).
O empregador tem direito de estabelecer contrato de experiência de até 90 dias (artigo 445), que pode ser dividido em dois períodos de 45 dias. Essa informação deve ser expressa em Anotações Gerais.

- Vale-transporte: é concedido ao trabalhador, com desconto de até 6% do salário bruto (lei nº 7418, de 16/12/1985 e decreto nº 95.247, de 17/11/1987).

- Férias:
todo trabalhador tem direito a 30 dias corridos de férias após 12 meses de trabalho, desde que não tenha mais do que cinco faltas não justificadas (artigo 130).
De acordo com o artigo 143 da CLT, o trabalhador pode converter 1/3 do salário em abono pecuniário (venda de 10 dias das férias).
-O pagamento das férias e do abono, se solicitado, deve ser feito dois dias antes do início do período.

- Faltas: o artigo 473 da CLT determina que o trabalhador pode faltar ao serviço sem desconto de salário em casos de:
 - falecimento do cônjuge, pai, mãe, filhos, irmão ou pessoa que viva sob sua dependência econômica (quando declarada na CTPS) – até dois dias consecutivos;
 - casamento – até três dias consecutivos;
 - licença-paternidade – até cinco dias consecutivos;
 - doação voluntária de sangue, devidamente comprovada – 1 dia por ano.
 - Adicional noturno: a pessoa que trabalha entre 22h de um dia e 5h do outro tem direito à remuneração superior à de quem trabalha no período diurno (artigo 73). O valor do acréscimo varia conforme acordo ou convenção coletiva de cada categoria. O pagamento da hora noturna é feito a cada 52 minutos e 30 segundos.

 - 13º salário: o pagamento do 13º salário é feito em duas parcelas, com base na remuneração mensal. A primeira, até 30 de novembro e a segunda, até 20 de dezembro.
A lei também permite que o trabalhador receba o 13º salário com as férias, mas ele deve fazer a solicitação à empresa sempre em janeiro.

- FGTS: o empregador deve recolher 8% do salário bruto do funcionário para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O Fundo é depositado em contas vinculadas na Caixa Econômica Federal. Em caso de demissão ou de aposentadoria, o trabalhador pode sacar o valor depositado.

Outros benefícios, como alimentação, assistência médica e odontológica variam de acordo com o que foi definido na contratação ou conforme acordo coletivo da categoria

Fonte: Folhapress