Funcionários sobrecarregados reconhecem facilmente os sinais
do burnout: cansaço extremo, distanciamento emocional e queda no senso de
realização. Mas, no outro extremo, existe um fenômeno menos discutido: o rust
out.
O termo descreve a perda de motivação e engajamento causada
por atividades monótonas, repetitivas e pela estagnação profissional. Diferente
do burnout, que surge da sobrecarga de tarefas, o rust out nasce da
subutilização de competências e da ausência de desafios significativos.
De acordo com estudo conduzido com formadores de professores
universitários, o problema tem crescido em ambientes que priorizam a eficiência
e o cumprimento de metas em detrimento do envolvimento profissional.
Diferenças entre burnout e rust out
O burnout está associado ao excesso de responsabilidades e à
dificuldade de lidar com demandas constantes. Já o rust out ocorre quando
faltam estímulos e oportunidades de crescimento.
Enquanto o burnout provoca esgotamento físico e mental, o
rust out resulta em apatia, procrastinação e busca por distrações, como tempo
excessivo em redes sociais durante o expediente. Ambos, no entanto, comprometem
a saúde mental e o desempenho profissional.
Sintomas do rust out
Entre os principais sinais do rust out estão:
Esses sintomas podem parecer menos graves que os do burnout,
mas, a longo prazo, também geram insatisfação profissional e problemas de saúde
mental.
Pesquisa com formadores de professores
A pesquisa analisou a rotina de 154 formadores de
professores do ensino superior, profissionais responsáveis por preparar futuros
docentes. Além do questionário aplicado, 14 deles participaram de entrevistas
detalhadas.
Apesar de muitos relatarem prazer em ensinar e orgulho da
carreira, parte significativa revelou sentir rust out. O excesso de tarefas
burocráticas, como relatórios e atividades administrativas, afastava esses
profissionais do que consideravam o núcleo de sua função: formar professores e
produzir conhecimento acadêmico.
Um dos entrevistados afirmou:
“Cerca de 70% da minha carga de trabalho agora é
administração. Isso é muito desmotivador.”
Burocratização e excesso de demandas
Segundo os pesquisadores, a burocratização crescente no
ensino superior, especialmente na Irlanda e no Reino Unido, tem ampliado a
carga de trabalho administrativa. Sistemas de compliance, mudanças frequentes
em processos e excesso de relatórios dificultam o foco em atividades de maior
valor acadêmico, como pesquisa e desenvolvimento de currículo.
Essa situação provoca a sensação de improdutividade. Um
docente relatou:
“No fim da semana, sinto que não produzi nada. Falta a
sensação de desenvolvimento.”
O impacto do desalinhamento profissional
O rust out também aparece quando há incompatibilidade entre
o potencial do trabalhador e as tarefas executadas. Profissionais com alta
qualificação em ensino e pesquisa, por exemplo, relataram frustração ao
desempenhar funções repetitivas e de baixo valor agregado.
Um entrevistado explicou:
“Muitas vezes, ficamos presos em uma zona de conforto, sem
desafios que poderiam estimular a criatividade.”
Esse descompasso entre talento e função pode ser
temporariamente tolerado, mas, com o tempo, gera queda de motivação e risco de
afastamento.
Restrição ao crescimento profissional
Outro fator que contribui para o rust out é a falta de
oportunidades de crescimento. Estruturas rígidas, ausência de incentivo à
mobilidade de carreira e pouca valorização do desenvolvimento profissional
agravam a sensação de estagnação.
Em alguns casos, funcionários são mantidos em posições
estáveis apenas para assegurar a continuidade operacional, sem considerar sua
satisfação ou evolução.
Um docente relatou:
“A conversa não é sobre satisfação no trabalho, mas apenas
sobre cumprir a tarefa. É como se tivéssemos sorte de ter um emprego.”
Custos escondidos do rust out
O rust out tem consequências individuais e institucionais.
Para o trabalhador, ele gera desengajamento, apatia e perda de motivação. Em
uma das entrevistas, um professor afirmou estar “funcionando sem prosperar”,
indicando a falta de propósito nas tarefas.
Para as organizações, o problema pode resultar em
dificuldades de retenção de talentos, ambiente organizacional negativo e
redução da inovação.
A falta de diálogo sobre o tema contribui para sua
persistência. Muitos profissionais evitam compartilhar a insatisfação, seja por
receio de julgamento, seja pela cultura organizacional de silêncio.
Relação com o quiet quitting
O rust out pode ser confundido com o fenômeno do quiet
quitting (“demissão silenciosa”), tendência em que trabalhadores cumprem apenas
o mínimo necessário.
No entanto, os formadores de professores analisados no
estudo não demonstraram intenção de abandonar suas funções. Pelo contrário,
mantinham comprometimento com alunos e com a profissão, o que tornava a falta
de estímulos ainda mais frustrante.
Por que o rust out deve ser debatido
Assim como o burnout, o rust out precisa ser reconhecido
como tema de saúde mental no trabalho. Instituições e empregadores devem
considerar o bem-estar de seus profissionais como parte estratégica do sucesso
organizacional.
Ao abrir espaço para tarefas criativas, desafios compatíveis
com as competências e oportunidades de crescimento, é possível reduzir os
riscos de desmotivação e estagnação.
O estudo sobre o rust out entre formadores de professores
revela um problema que pode se estender a diversas áreas profissionais. Embora
menos conhecido que o burnout, o rust out apresenta impactos significativos
para a saúde mental, a satisfação profissional e o desempenho institucional.
Reconhecer e discutir esse fenômeno é um passo importante
para repensar práticas de gestão de pessoas e criar ambientes de trabalho que
promovam não apenas produtividade, mas também realização pessoal e engajamento.
Fonte: The Conversation/g1