Na segunda-feira (8), o Itaú Unibanco demitiu cerca de 1.000
funcionários alegando baixa produtividade, com base em dados de softwares de
gestão. Embora a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) autorize
o uso dessas ferramentas desde que informados aos colaboradores, o episódio
reacendeu o debate sobre como esses sistemas são aplicados e quais métricas
definem o desempenho.
O mercado de softwares de produtividade cresceu com o avanço
do trabalho híbrido após a pandemia da Covid-19. As ferramentas acompanham a
distribuição do tempo de trabalho, analisam padrões de uso do computador e
transformam dados em relatórios de desempenho.
A Evope, empresa brasileira que atende mais de 50 clientes
como Natura, Banco BMG e Petz, utiliza algoritmos para avaliar o uso do
computador corporativo. O cofundador Danilo Lira explica que o sistema funciona
como uma “curadoria”, identificando se as atividades condizem com o perfil de
cada setor.
O software monitora tempo ativo, cliques, sites acessados,
uso de plataformas da empresa e tarefas que podem ser automatizadas. Segundo
Lira, manter 80% do tempo produtivo em uma jornada de 40 horas semanais é
considerado saudável, cerca de 6 horas de trabalho em um expediente de 8 horas.
Índices abaixo indicam ociosidade, e acima desse nível geram alerta por risco
de burnout.
“Nós fazemos treinamentos para humanizar as informações que
chegam até os gestores”, afirma Lira.
A plataforma classifica resultados em verde, amarelo,
vermelho e roxo e pode mostrar aos colaboradores seus períodos produtivos,
médias e comportamento digital. Cabe à empresa decidir se libera esse acesso.
Segurança de dados também motiva uso
Especialistas apontam que o interesse das empresas vai além
da produtividade. O perito em crimes digitais Wanderson Castilho destaca o
papel dessas ferramentas na proteção de informações confidenciais e auditorias:
“Existem até ferramentas que monitoram o conteúdo do que
você imprime e do que copia em um pen drive”, diz.
Na Time Doctor, o vice-presidente de pessoas e cultura,
Vinícius Coelho, esclarece que não há coleta de conversas pessoais, e-mails,
arquivos ou atividades fora do expediente.
“Cada empresa configura de acordo com sua realidade. Uma
instituição financeira pode ativar relatórios de uso para compliance, enquanto
uma agência criativa prefere só acompanhar tempo de projetos sem capturas”,
explica Coelho.
A Monitoo adota lógica parecida, mas não registra teclas
digitadas ou cliques.
“Estar no Facebook pode ser estratégico para o marketing,
mas improdutivo para vendas”, exemplifica o cofundador Murilo Rodrigues, cuja
empresa atende mais de 500 clientes. As classificações geram um score de
produtividade e comparativos entre setores, com relatórios semanais enviados
aos gestores.
Uso inadequado pode distorcer resultados
Para a pesquisadora Sylvia Hartmann, a eficácia dos
softwares depende da liderança:
“O software pode atualizar protocolos, indicar onde tem
gargalo, sugerir melhorias de comunicação, avaliar desempenho e aumentar o
ganho de eficiência”, avalia.
Ela alerta que o recurso não deve ser usado de forma
punitiva sem antes permitir ajustes:
“Se for preciso que haja desligamento, antes é necessário
coletar essas informações e dar um feedback para a liderança ter um prazo para
tentar reverter o caso.”
Posição do Itaú
Em nota, o Itaú Unibanco informou que as demissões ocorreram
após quatro meses de análises, identificando funcionários em regime remoto com
baixos níveis de atividade digital, alguns com apenas 20% de atividade diária,
mesmo registrando horas extras.
O banco disse ainda que a média de atividade digital entre
colaboradores em home office é de 75%, índice considerado adequado. Casos
abaixo desse patamar, segundo o comunicado, “denotam desvio do padrão de
comportamento e quebra de confiança”.