

O Brasil ocupa o primeiro lugar em um levantamento
internacional que analisou a incidência de supersalários no funcionalismo
público em 11 países. O estudo, conduzido pelas organizações República.org e
Movimento Pessoas à Frente, comparou estruturas remuneratórias de servidores no
Brasil, Alemanha, Argentina, Chile, Colômbia, Estados Unidos, França, Itália,
México, Portugal e Reino Unido.
Segundo os dados, 53,5 mil servidores ativos e inativos
brasileiros recebem acima do teto constitucional de R$ 46.366,19, resultando em
um gasto anual estimado de R$ 20 bilhões, ou US$ 8 bilhões em paridade de poder
de compra (PPC). O volume é 21 vezes superior ao registrado na Argentina,
segundo país que mais gasta com remunerações extrateto.
Comparação internacional evidencia distorções
O estudo mostra que, enquanto o Brasil ultrapassa a marca de
50 mil remunerações acima do teto, os Estados Unidos têm pouco mais de 4 mil
casos, e nenhum outro país da amostra supera 2 mil. A Alemanha, por exemplo,
não registra qualquer supersalário.
A metodologia considera como irregular qualquer pagamento
que ultrapasse o limite legal de cada país. Onde não há teto formal, foi
adotada como referência a remuneração do chefe de governo. Os dados analisam o
período entre agosto de 2024 e julho de 2025.
No Brasil, os supersalários estão concentrados
majoritariamente no Judiciário, no Ministério Público e nas carreiras da
Advocacia-Geral da União. A magistratura recebe a maior parcela: 21 mil juízes
acima do teto, somando R$ 11,5 bilhões ao ano.
Magistrados brasileiros estão entre os mais bem
remunerados do mundo
O levantamento também compara a elite salarial do
Judiciário. O Brasil registra quase 11 mil juízes recebendo mais de US$ 400 mil
no período analisado, cerca de R$ 1 milhão, valor superior ao pago em sete dos
dez países avaliados. Em situações excepcionais, com pagamentos retroativos,
servidores chegaram a ultrapassar US$ 1,3 milhão no ano.
A remuneração inicial de magistrados brasileiros é a quarta
maior entre os países do estudo, ficando atrás apenas de EUA e México. No topo
da carreira, um juiz brasileiro chega a ganhar quatro vezes mais do que
magistrados de cortes constitucionais da Alemanha, França, Argentina e Estados
Unidos.
Penduricalhos e verbas indenizatórias ampliam distorções
De acordo com os pesquisadores, a existência de uma ampla
gama de verbas indenizatórias, muitas isentas de Imposto de
Renda, permite que servidores ultrapassem o teto constitucional, um
fenômeno considerado raro ou inexistente em outros países.
Sérgio Reis, autor do estudo, afirma que a transformação
recorrente de benefícios em verbas indenizatórias aproxima o salário líquido do
bruto, ampliando a diferença internacional. A professora Alketa Peci, da
Fundação Getulio Vargas (FGV), reforça que mecanismos de autorregulamentação,
como no âmbito do CNJ, fortalecem o corporativismo e dificultam ajustes
estruturais.
Impacto fiscal e debates no Congresso
O relatório foi elaborado para subsidiar parlamentares na
discussão de medidas que limitem os “penduricalhos” usados para contornar o
teto remuneratório. A proposta tramita há quase dez anos e encontra resistência
principalmente no Judiciário.
A pressão por revisão é reforçada por dados de opinião
pública: levantamento Datafolha indica que 83% dos brasileiros rejeitam os
supersalários e defendem o fortalecimento do teto constitucional.
Se a amostragem usada pelo estudo fosse ampliada, o custo
anual poderia chegar a R$ 40 bilhões, equivalente a 40% do déficit fiscal
projetado pelo governo federal para 2025, segundo estimativas da República.org.
O peso dos supersalários dentro do serviço público
O Brasil também lidera o ranking de servidores no 1%
mais rico da população, com 40 mil funcionários públicos que declararam
renda anual superior a R$ 685 mil em 2025. Na Colômbia, segunda colocada, esse
número é de apenas 2.774.
Apesar do número absoluto elevado, os supersalários
representam 1,34% do universo analisado de 4 milhões de servidores. Ainda
assim, especialistas alertam que o impacto fiscal e simbólico é significativo,
reforçando desigualdades e reduzindo a capacidade do Estado de investir em
áreas essenciais.
Como outros países enfrentam o problema
O estudo apresenta boas práticas internacionais:
Especialistas ouvidos enfatizam que a correção das
distorções salariais é pré-condição para qualquer reforma administrativa ampla.
Para a República.org, regular melhor salários e benefícios é essencial para
sustentabilidade fiscal e confiança na administração pública.
Com informações da Folha de S. Paulo